Capítulo 26







Deixei-me dormir por um longo tempo acordando na sala com as luzes apagadas e um cobertor de lã sobre mim. As janelas estavam entreabertas deixando o vento passar e fazendo os cortinados esvoaçar causando um som um pouco assustador. Levantei-me lentamente do sofá, no qual, aparentemente, tinha dormido bastante tempo, e chamei pelo meu pai, mas logo presumir que já se encontrava a dormir, pois não me respondeu.



Sentia calafrios por todo o corpo proporcionando-me um grande desconforto tanto psicológico, pelo medo que comecei a ganhar por aquele escuro e silêncio que se instalaram em casa, e físico, pelo frio que tinha pelo facto das janelas estarem abertas e pelas fortes e incomodativas dores que me apunhalavam as costas por consequência daquela longa sesta no sofá.
Fechei todas as janelas que estavam abertas, que tinham um aspecto bastante envelhecido, o que estranhei imenso pois não me lembrava de as ver assim tão degradadas. E por fim tentei acender as luzes que, assustadoramente, se encontravam apagadas, mas para meu azar não as consegui acender pelo facto de, estranhamente, não haverem interruptores. Comecei a sentir um incomodativo formigueiro na barriga como algo estivesse para acontecer, o que me estava a assustar imenso.
O papel de parede da sala encontrava-se rasgado, as janelas ferrugentas e velhas, não havia candeeiros nem algo que se pudesse considerar luminoso, o vento continuava a soprar, embora as janelas estivessem todas fechadas.



Comecei a sentir uma grande dor no peito, como um aperto, que me deixava bastante maldisposta e incapacitada de falar. Olhei para as escadas, pelas quais queria subir imediatamente para acordar o meu pai, e tinham um aspecto bastante assustador. Aquela madeira coberta de uma fina e brilhante camada de verniz estava agora pouco ou nada brilhante mas sim com um aspecto velho, degradado e opaco.
E nesse momento, a minha atenção desviou-se para o quarto do meu pai, do qual ouvi um grito sofredor de uma mulher.



Subi as escadas lentamente, as quais chiavam à medida que as pisava, e pus-me cada vez mais atenta aos gritos que provinham do quarto. Quando cheguei lá em cima, os gritos pararam, mas mesmo assim, mantive-me imóvel à espera de mais algum som que provasse que eu não estava a enlouquecer. Encostei a minha cabeça à porta e ouvi outro grito mas desta ver mais enfraquecido.



Bati à porta, mas ninguém respondeu. Bati mais uma vez e ninguém respondeu. Até que decidi entrar. Rodei lentamente a maçaneta de cobre velho e entrei no quarto, com as pernas trémulas, chamando pelo meu pai, mas mais uma vez não respondeu. Fechei a porta do quarto e um silêncio aterrorizador instalou-se como se estivesse dentro de uma sala à prova de som, sozinha e às escuras. Por sorte, tinha o meu telemóvel na algibeira portanto não hesitei em tirá-lo e utiliza-lo como lanterna. Mas nesse momento, desejei mais estar às escuras do que ver aquela terrível visão. Na poltrona do meu pai, encontrava-se uma mulher com cabelos longos e negros como o breu e um vestido branco. Era igualzinha à que tinha visto no quintal naquela tarde.



Ela estava de cabeça para baixo a chorar desalmadamente como se o mundo tivesse desabado. As lágrimas caíam-lhe em abundância molhando-lhe o vestido e o lindo cabelo preto. Mas parou imediatamente, quando lhe perguntei se se sentia bem. Levantou a cabeça lentamente e nem queria acreditar no que estava a ver, com a cara feita em feridas, suja e alagada em sangue… era a minha mãe.



O meu coração disparou nesse momento. Recuei incalculáveis passos até à porta mas algo me prendia ao chão fazendo-me andar constantemente no mesmo sítio. O pânico tomou conta de mim, enfraquecendo-me as pernas e fazendo-me gritar:
- MÃÃÃÃÃÃE!
E nesse momento, senti o meu corpo levitar como uma pena e rodopiar como um velho e inútil pião de uma criança. E quando dei por mim estava de novo no sofá com a mão do meu pai no meu ombro perguntando de me sentia bem.



- Melody! Estás bem? Acorda!



Levantei-me lentamente. Olhei em redor… desta vez havia luz, janelas em condições, papel de parede como novo e escadas envernizadas. Tinha sido um pesadelo.
Estava alagada em suores frios, a minha roupa colava-se ao meu corpo e estava completamente desnorteada. Respirei fundo, esfreguei os olhos e ergui a cabeça dizendo:
- Estou bem… foi só um pesadelo.
- Pregaste-me um susto hoje, Melody! Primeiro a tua quebra de tenção no Quintal e agora isto?



- Eu estou bem pai! A sério! Só preciso de tomar um duche.
Olhei para o relógio e ainda eram 21:30 H. Levantei-me do sofá, espreguicei-me suavemente e fui de imediato para a casa de banho onde tomei um duche quente e calmante. Fechei os olhos e só me conseguia lembrar da minha mãe naquela poltrona. Estava completamente confusa e desesperada.
Saí da banheira e fui para o meu quarto, onde vesti o meu pijama e me deitei na cama. Descontraí o meu corpo todo, descontraí os meus músculos, os meus olhos… tudo.
Fechei os olhos e só voltei a acordar com o barulho do bater da porta que ecoou escada acima que mostrava que, mais uma vez, o meu pai estava atrasado para o emprego.



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