Capítulo 25



- Bem, não sabia que ela tinha mudado assim tanto… - Disse o Jake. – Será que ela algum dia vai acordar dessa ilusão?
- Não sei… mas duvido. Ela já não vai mudar…



Nesse momento, ao longe, avistei os amigos do Dave, a passarem a bola de Rugby uns aos outros. O Jake, em vez de ir ter com eles, apenas se limitou a acenar-lhes sorrindo, e permaneceu ao pé de mim.
- Não vais ter com eles? – Perguntei.
- Bem… se eles cá vierem ter, tudo bem. Mas eu convidei-te para estares aqui portanto… não faria sentido deixar-te sozinha.
Uma atitude notável, por parte do Jake. Fiquei bastante impressionada. Mas os amigos do Jake vieram ter connosco dizendo algumas piadas de mau gosto, deixando-me um pouco incomodada.
- Hei, Jake. Queres vir jogar? – Perguntou um dos amigos.
- Não… podem ir jogando. Eu depois vou ter com vocês.
- OK… oh! Não me apresentaste a tua namorada! – Exclamou o seu amigo no meio de risadas.



- Huh… eu não sou namorada dele…
- Pessoal… é melhor irem. – Disse o Jake com uma cara séria. – Desculpa lá isto. – Continuou sentando-se outra vez. – Eles são um pouco parvos.
- Não faz mal. Bem, é melhor ir andando. Já está a escurecer. – Disse eu levantando-me.
- Não queres ficar a assistir ao jogo?
- É melhor não… além disso, disse ao meu pai que estava em casa cedo.
- OK… então… vemo-nos na Escola.
- Sim… na Escola. Tchau.
Saí do campo enquanto o Jake se juntava aos seus amigos, que lhe davam palmadas nas costas e faziam aquelas brincadeiras típicas, para iniciarem um jogo de Rugby.



Pelo caminho, fui a pensar nas cartas que tenho recebido. Não fazia ideia de quem eram, mas tinham de ser de alguém com um grande coração. Eu consigo ver que aquelas cartas não são escritas por qualquer um. Foram escritas por alguém extremamente sentimental e sereno. Alguém que consiga escrever aquelas cartas tão lindas, mas que ao mesmo tempo me deixam intrigada e perturbada.
Espero que o que disse ao Jake sobre a Cassie fique só entre mim e ele. Não gosto que pensem que falo das pessoas nas costas. Mas desta vez foi inevitável. Não pude conter a tristeza que me dá ao vez uma rapariga, que outrora foi uma das minhas melhores amigas, mudar assim tanto… não por vontade mas sim por influência. Esta não é a Cassie que eu conheço.
Enquanto andava pela calçada a caminho de casa, fui apreciando a paisagem e sentindo o vento contra a minha face. Estava um fim de tarde ligeiramente frio, contudo, extremamente bonito. Apesar do frio ligeiro que se fazia sentir, o céu estava com uma cor de autêntico Verão. Alaranjado e sem nuvens.
Quando me aproximava de casa, já conseguia ver o meu pai a cuidar da sua Horta que só ele sabe o quão valiosa é.
- Olá filha. Não esperava que viesses tão cedo.
- Eu disse-te que vinha cedo. – Disse eu sentando-me à sombra de uma árvore do Quintal.
- Como correu esse passeio?
- Bem… O Jake é muito simpático.



- Ainda bem que te estás a relacionar bem com os teus colegas. Fico feliz por ti! – Disse o meu pai dando-me uma festa na cara.
O meu pai nem sabe o quanto está enganado, mas apenas me limitei a sorrir e a afirmar que me tinha integrado com facilidade.
E nesse momento comecei a sentir-me um pouco estranha. Tinha uma dor de cabeça enorme e comecei a sentir-me tonta. Não pude disfarçar a minha expressão de perturbada.
- Melody? Melody, está bem? – Perguntava o meu pai preocupado.
- Sim… estou bem… - Disse eu com uma voz enrouquecida.
Aquela dor atacava-me a nuca alastrando-se por toda a cabeça deixando-me sem noção de onde estava.
Fechei os olhos e quando os voltei a abrir nem queria acreditar no que estava a ver, outra vez...



Vi uma mulher, numa imagem turva, com uns longos cabelos pretos, um vestido branco a arrastar pela relva acabada de regar do Quintal e os seus olhos iluminados com uma cor esverdeada.
Voltei a fechar os meus olhos e quando os voltei a abrir já lá não estava e apenas consegui ouvir a voz do meu pai com um tom preocupado perguntando se eu me sentia bem.



- Eu estou bem, pai. Só preciso de… descansar.
- Vai lá… eu chamo-te quando o jantar estiver pronto!
Entrei pela porta das traseiras e dirigi-me para a sala, onde me deitei no sofá. Desliguei a televisão, pois não estava com disposição para os noticiários e os comentários do jogo de Futebol daquela manhã.
Deixei-me cair na almofada do meu pai que tinha ficado ali quando muito provavelmente adormeceu e deixei-me levar pelo cansaço e má disposição caindo num sono profundo.



Capítulo 24

Estava completamente aparte da realidade. Apenas olhava para aquela Igreja com um brilho resplandecente nos olhos. Tudo à minha volta tinha deixado de existir, fechando-me apenas no meu mundo. O mundo que eu criei. Um mundo que não existe… apenas no meu coração. Mas tudo desapareceu, levando-me de novo para a realidade, quando o meu pai me telefonou.
- Melody! Onde é que tu estás? Sabes que horas são? – Perguntou o meu pai pouco satisfeito.
- Oh… desculpa pai! Distraí-me com as horas. Vou agora para casa. Tchau.
Desliguei o telefone rapidamente, já me bastava o sermão que ia levar quando chegasse a casa. Não o queria ouvir por telefone.
Quase que corri até casa, olhando algumas vezes para trás, para contemplar a Igreja enquanto podia.



Quando cheguei a casa, o meu pai estava sentado na sua poltrona, olhando para o Hall de entrada com uma cara zangada.
- Melody, tu sabes que eu te dou liberdade… mas não abuses dela!



- Desculpa, pai, distraí-me com as horas e…
- Onde é que foste?
- Huh… fui para um lugar que eu conheço aqui na cidade. Um jardim… - Eu odiava mentir ao meu pai, mas se eu dissesse que tinha ido passear para um Igreja, o meu pai acharia que eu estava a enlouquecer… talvez tivesse razão.
- Que isto não se volte a repetir! – Disse ele, mudando a sua expressão zangada, para aquela que eu adoro profundamente… a expressão despreocupada e sorridente.
Sentei-me no sofá com o meu pai, para lhe fazer um pouco de companhia. Com o passar do tempo, tenho-me esquecido do valor da família. É ela que está presente, nos momentos em que mesmo os melhores amigos nos deixam… está presente nos bons e nos maus momentos. O meu pai desempenha esse papel melhor do que ninguém.
Não levou muito tempo até as minhas pálpebras me caírem e a minha cabeça se aconchegar no ombro do meu pai, coisa que já não fazia há muito tempo.



Passados uns momentos, a única coisa que senti foram os seus lábios na minha testa, sussurrando “Boa noite”, tapando-me com os lençóis e apagando a luz do candeeiro da mesinha de cabeceira.
Acordei na manhã seguinte de Sábado com o meu telemóvel a tocar. Era o Jake.
- Estou? – Atendi, com uma voz trémula do sono.
- Estou, Melody. Desculpa estar-te a ligar a esta hora, mas costumo fazer uma corrida matinal ao fim-de-semana e esqueço-me dos horários dos outros.
- Não faz mal, Jake. O que se passa?
- Nada… apenas queria convidar-te para almoçares comigo. Conheço aqui um restaurante excelente. O que dizes?
- Bem, é muito em cima da hora, mas está bem. Eu vou.
- Óptimo… então encontramo-nos ao meio-dia.
Meio-dia?! Era cedo demais para um Sábado, mas não pude recusar. Olhei para o relógio e ainda era 7:00 H, por isso deixei-me cair de novo na almofada dormindo mais algumas horas, um pouco mal dormidas, coisa que tem acontecido frequentemente nestas últimas semanas.
Levantei-me às 10:00H e tomei o pequeno-almoço. O meu pai estranhou eu levantar-me tão cedo a um Sábado, mas eu expliquei-lhe que ia sair com o Jake, e já se pode adivinhar o que o meu pai disse:
- Isso ainda vai dar numa…
- Pai! Não te atrevas a completar essa frase!
- O que foi? Eu queria dizer que isso ia dar numa grande amizade! – Exclamou ele no meio de gargalhadas.
- Pois, muito engraçadinho!
Dirigi-me á cozinha e fiz os meus cereais. Quase me assustava com o grito de “GOLO!” do meu pai quando uma das equipas, que eu não sei e nem quero saber, marcou. Parece que a Taça Mundial começa cedo. Pessoalmente, nunca gostei de Futebol, mas quando era pequena costumava acompanhar o meu pai nos jogos, era super divertido.
Vesti-me lentamente, escolhendo uma roupa casual, e saí de casa com uma mensagem do Jake a dizer que estava à minha espera na esplanada do restaurante.
O almoço correu muitíssimo bem. Consegui abstrair-me de algumas coisas de uma maneira agradável e animadora. O Jake é bastante conversador, tem sempre um tema de conversa, mesmo que essa seja uma história secante, mas a maneira dele falar torna qualquer história encantadora.
O restaurante onde estávamos era bastante agradável. A decoração era simples e natural. Haviam plantas por toda a parte e uma pequena fonte à entrada feita de pedra branca como a neve.



Depois do almoço o Jake pediu-me para irmos ao Campo de Rugby. Ele disse que as vistas da última bancada eram simplesmente maravilhosas.





- Tu e a Cassie são muito amigas não é? – Perguntou-me ele enquanto olhava para as imensas montanhas de Fort Sim.
- Na verdade, éramos. Digamos que a mudança de personalidade da Cassie contribuiu para um mau clima entre nós. Ele agora tem a Sarah por isso… não deve dar por minha falta.



- Mas… eu não acredito que elas sejam amigas, a Sarah é demasiado fútil para merecer amigas… É mais uma “relação profissional” entre empregada e patroa.
- Sim, mas a Cassie é capaz de trocar uma verdadeira amizade pela “Relação Profissional” entre ela e a Sarah.



- Ela sempre foi assim? – Perguntou o Jake, olhando para mim. – Obcecada e tímida?
- Não… há uns anos, a Cassie foi uma rapariga excepcional. Fazia-me rir a toda a hora. Passávamos tardes infinitas a comer gelados e a rirmo-nos juntas.



- E aqueles olhos. – Continuei. – Verdes claros… eram autênticos Rubis. Aquele cabelo castanho ondulado… Ela era única.



- Mas ela ainda tem olhos verdes… - Disse o Jake no meio de um sorriso.
- Sim… mas perderam a cor com o passar dos anos. Perderam aquele verde de uma rapariga pura, extraordinária e simpática.



Capítulo 23





- Jake… eu não sabia que eras assim… Pensei que querias mesmo competir para…
- Ganhar não é? Mas não. Apenas me quero divertir, mais nada.
Vi que já era tarde, e apressei-me para a última aula do dia…
O pai não me pôde ir buscar à escola, pois tinha alguns processos lá do escritório em atraso, e queria acaba-los hoje. Vim de autocarro e por isso, 10 minutos depois da aula acabar, já eu estava em casa.



Fui temperar o frango comprado a pressa na véspera e fui adiantar algumas tarefas domésticas, já que o computador estava a fazer um scanner e na televisão não estava a dar nada que me apetecesse ver. Assim, fui lavar as mãos, alguma roupa que não convinha ir para a máquina e aproveitei também para lavar a minha mala; que deveria ter lavado nas férias de Verão.





Despejei tudo o que tinha nela para o chão. Desde livros e canetas a bocadinhos de papel e aparas de lápis, tudo foi parar ao chão. Eu não fazia ideia que tinha tanto lixo na minha mala, já para não falar das nódoas que tinha acumulado no tecido de lona preta. Entre todas aquelas coisas, fui descobrir um papel cuidadosamente dobrado. Não fazia a mínima ideia do que poderia ser. Talvez uma ficha esquecida ou um papel sem importância. Desdobrei-o e a minha boca abriu-se de espanto. Era mais uma daquelas cartas de amor:

"Eu amo-te. Provavelmente para sempre. As raízes que criaste em mim são sólidas, quase tão sólidas como o ferro. Gostaria que me amasses deste modo, mas sei que isso não acontece. Talvez um dia possamos ser felizes os dois. Acredita, nada me faria mais feliz. Enquanto esse dia não chega, contento-me com a tua existência. Amo-te de um modo tão intenso, que chega a magoar. E esta dor não me deixa viver. Mesmo que um dia não me queiras, fica o aviso: Eu amo-te.

Assinado: Confidencial..."


Sentei-me no chão gelado da cozinha, sem sequer me importar com as imensas gotas de água que me molhavam a blusa e as calças. Se, por um lado, me agradava a ideia de ter um admirador secreto, por outra não achava piada nenhuma a situação. Nem tão pouco imaginava quem poderia ser. Completamente atónita, voltei a dobrar o papel e guardei-o debaixo do saco de pão. Regressei às tarefas domésticas, mas sem qualquer sucesso. Tudo me correu mal: a água jorrou do balde onde lavava a roupa e inundou a cozinha. O aspirador caiu, fazendo uma racha no pequeno ecrã de vidro e o frango que, entretanto, pusera no forno, queimara. A minha cabeça, mais do que nunca, estava num planeta longínquo. Ouvi o barulho de uma chave a ser introduzida na porta e apercebi-me que vinha o meu pai. Esforcei-me ao máximo por parecer satisfeita e descontraída, mas a minha palidez foi logo evidenciada.

- Hei, Mel! Como correram as aulas? - Perguntou, demasiado contente para alguém que tinha ficado até mais tarde no emprego.



- Correram bem. Pai, vamos jantar?
- Sim, vamos. Mel, esta tudo bem? Estás tão pálida!
- Ah não é nada, pai, não te preocupes. - Respondi, com um ligeiro tremor na voz.
Ele franziu o sobrolho e avistou a carta de amor que eu, despreocupadamente, pusera debaixo do saco de pão.
- Isto é alguma coisa que eu deva saber? Como por exemplo alguma carta da escola? - Exclamou, subitamente desconfiado.
- Não, pai é só... um rascunho... de um trabalho... de Português. É de uma composição.
- Ah, que interessante! Posso ler?
- NÃO! - Gritei, arrancando o papel da mão do meu pai.



Ele ficou espantado, mas não zangado. Analisou a minha expressão e suspirou. Não estava á espera da minha reacção, e estava a ponderar se deveria realmente ler ou não o papel. Eu sorri-lhe, nervosa, e a expressão dele descontraiu.
- Tudo bem! – Disse ele - Vamos jantar?
Ao jantar, falei ao meu Pai da reportagem que iam fazer na minha escola, na qual o centro das atenções ia ser a Sarah. Ele mostrou-se interessado… aliás, o meu pai mostra-se sempre interessado com os meus assuntos da Escola. Quer que eu me socialize e que me dê bem com a nova turma, embora isso seja um pouco difícil, mas não o quero preocupar com assuntos sem importância, portanto finjo que está tudo bem e que já consegui fazer amizades.



Quando acabámos o jantar, reparei que ainda era dia. Disse ao meu pai que ia dar um pequeno passeio, e ele permitiu-me sem nenhuma questão.
Peguei nas chaves e mal abri a porta uma suave brisa invadiu o Hall de entrada. Desci o pequeno lance de escadas da entrada e comecei a andar por caminhos incertos. Não tinha rumo… apenas queria apanhar ar e pensar naquilo que me está a pôr doida: Os meus sonhos, as sombras que eu vejo, as cartas de amor. Tudo isto me está a pôr preocupada.



Primeiro, eu não costumo sonhar com algo que nunca vi na minha vida… Nunca vi aquela criança, nunca vi aquele homem a chorar ajoelhando-se num prado que eu nunca vi na vida… Só tenho a Igreja… e essa sim… eu vi. E parece que há algo nela. Parece que tenho uma espécie de telepatia com aquela Igreja. Eu sei que é estúpido, uma pessoa estar tão atraída por um lugar… mas eu sinto-me bem nele. Sinto todas as minhas preocupações abandonarem a minha mente e deixarem-me na paz e no sossego. Lá não penso nas preocupações que me trituram a mente e me fazem sentir da pior forma possível. E foi nesse momento, que eu finalmente tomei um rumo no meu pequeno passeio.
Virei a esquina de uma pequena rua sem movimento e lá avistei a Igreja. Aproximei-me o máximo que me atrevia e parei em frente aquele lindíssimo monumento. Os sinos balançavam ligeiramente com o vento que penetrava nas janelas partidas e consumidas pela chuva. Da pintura, apenas restavam algumas farpas velhas e frágeis, e já estas estavam prestes a cair. Os arbustos e as árvores, que já algumas folhas perderam com o correr das estações, balançavam em simultâneo.



Fechei os olhos, e finalmente senti a minha mente a ser esvaziada. Senti as minhas preocupações e deveres saírem da minha mente sendo levados pelo vento em direcção àquele infinito céu já alaranjado pelo entardecer do dia.


Capítulo 22

Acordei na manhã seguinte após ter dormido apenas uma hora e meia. Sabia que não podia faltar… era o dia da apresentação do trabalho.
Quando fui para a cozinha, o meu pai já estava acordado, dizendo, no meio de loiça partida e passos acelerados, que estava atrasado para o emprego, o que significava que eu também estava atrasada para a escola.
Subi de novo as escadas, desta vez mais apressadamente, e fui arranjar-me. Dei uma penteadela rápida no meu cabelo, que estava pior do que aparentava, escolhi apressadamente a minha roupa, lavei a cara e os dentes, desci as escadas, peguei na última maçã que havia na fruteira, pedindo ao meu pai que comprasse mais, e saí de casa a correr.
Tinha algum dinheiro para o bilhete do Autocarro, mas este não tinha esperado por mim, obrigando-me a dar uma pequena corrida até à escola.



Pelo caminho, a minha cabeça transbordava memórias, preocupações e a matéria do trabalho de projecto que tinha de explicar na apresentação à qual já estava atrasada. Quando me aproximei da escola, já todos estavam a entrar nas suas salas de aula. Meti-me no meio da multidão e apressei-me para a minha sala. Para meu espanto, a minha turma ainda não tinha entrado.
- Melody! Já começava a ficar preocupado! É hoje a apresentação do nosso trabalho. – Disse o Jake com os seus olhos arregalados, tentando recuperar do susto que apanhou por não me ter visto a horas na escola.
- Eu sei, Jake… Estás preparado?
- Sim… e tu?
- Também… Dormi mal esta noite.
- A sério? Porquê? – Perguntou ele preocupado.
- Jake… a sério, tu não queres saber… confia em mim!
Nesse momento, a Cassie chegou ao pé de mim, ofegante, dizendo histericamente.
- Melody! Melody! Tu nem vais acreditar!



- O que se passa?
- A Sarah Mello dar uma reportagem… Aqui na escola!!!
- Oh… que interessante.
- Pois é! Eu sabia que ias ficar tão entusiasmada como eu! – Exclamou a Cassie.
Após ter forçado um sorriso de entusiasmo por aquela notícia tão “estrondosa”, entrei na sala de aula.
A apresentação do trabalho nem correu da pior forma… tirando aquelas típicas e complicadas perguntas que a professora Marie colocava, tirando, com uma cara intrigada e misteriosa, alguns apontamentos no seu caderno pela atitude dos alunos durante a apresentação.

Assim que deu o toque para sair, o Jake veio ter comigo, com um grande sorriso:
- Melody! Falei com a professora e ela vai-nos dar nota máxima!
- Estás a falar a sério? – Perguntei eu perplexa.
- Sim! Nunca tinha tido tão boa nota num trabalho de grupo! Todos os trabalhos que eu fazia, acabava por me distrair com os meus amigos. Mas contigo foi diferente! Obrigado!



- Não tens de me agradecer, Jake. A nota que nós tivemos foi fruto de não só do meu trabalho, mas como também do teu!
A conversa entre mim e o Jake foi logo interrompida com várias vozes de Jornalistas que entravam na Escola em peso. Todos eles iam em direcção a uma pessoa: a Sarah. Cercaram-na, bombardeando perguntas e disparando flashes
com as suas máquinas fotográficas. A Sarah apenas se limitou em mexer no seu cabelo, retocar o seu batom e pousar para as fotografias que muito provavelmente iam sair nas capas daquelas revistas cor-de-rosa.





- Anda, vamos embora. – Pediu o Jake, que, tal como eu, não tinha paciência para assistir àquela entrevista.
Saímos do Pavilhão principal e fomos para o pátio que ficava nas traseiras do edifício da Escola.
Fomos para um lugar que eu conhecia tão bem, como a palma da minha mão. Era um sítio simples, mas excepcionalmente magnífico. Haviam arbustos com flores de diferentes cores que cercavam um banco de Jardim feito de uma madeira já velha e desgastada. As árvores, apesar do seu pequeno tamanho, faziam uma sombra muito agradável e refrescante, onde nos podemos refugiar nos dias de Verão. Eu gosto de sítios simples… acredito que nós próprios possamos acrescentar alguma coisa a esses sítios… memórias, sentimentos, recordações… tornando-os únicos e incomparáveis.



- Adoro este lugar. – Murmurei. – Traz-me muitas recordações. Vinha sempre para aqui com as minhas amigas sempre que tinha furos de horário… mas já não as vejo há muito tempo.
O Jake olhou para trás e, apontando para a janela do corredor central da Escola, através do qual se conseguiam ver os jornalistas a cercar a Sarah, disse:
- Eu já passei por isto. Quando a minha equipa ganhou o torneio Inter-Cidades, todos aqueles Jornalistas vieram ter comigo. Todos os meus colegas, amigos, vizinhos e até familiares me chamaram de “Sortudo” por ser tão admirado e falado na cidade… mas não sou, Melody. Adoro desporto, e não o faço por querer alcançar o primeiro lugar no Pódio… não o faço por querer ser o melhor e admirado por todos. Faço-o por prazer, por divertimento. Considero cada jogo uma oportunidade de estar com os meus amigos e de aprender coisas novas. Até porque… o desporto é mesmo isso… Divertimento. É uma maneira de estar na vida, não uma maneira de alcançarmos a fama!
As palavras vindas do Jake tocaram-me. Nunca ninguém tinha dito uma coisa tão sincera… uma coisa que eu saiba que vem mesmo do fundo do coração.



Capítulo 21



Quando finalmente acabámos o trabalho, o Jake apressou-se para a porta, dizendo que ia ter mais um treino e prometendo que ia estudar o tema do trabalho para a apresentação que se ia dar no dia seguinte. Tudo correu da melhor forma, tirando aquele pequeno incidente entre mim e o Ron. Por um lado, fiquei triste por a nossa despedida acabar numa zanga, mas por outro acho que ele merecia, pois ele estava ciente que eu não gostava dele e que apenas queria ser sua amiga, como dantes… mas desde criança que o Ron é feito de uma persistência fora do comum e não descansa sem obter o que quer e hoje não foi excepção. Acho que foi melhor assim… tanto para mim como para ele.
Olhei pela janela, e vi o meu pai a colher algumas alfaces da sua pequena horta, que tanto estimara ao longo destes anos. Estava um dia lindíssimo, apesar daquela constante brisa fria que marca o início do Outono e o fim daquele magnífico Verão com praia, divertimento e calor.
- Tu nunca deixaste essa horta. – Disse eu, caminhando em direcção do meu pai.



- Tu sabes como eu me afeiçoo às coisas. E além disso tenho de começar a colher os vegetais porque o frio está a chegar.
- Muito bem… Afeiçoado e dedicado com as coisas!
O meu pai sorriu enquanto agarrava nas alfaces e as punha no seu cesto.
- Bem, acho que já está. Vou fazer a sopa para o jantar.
- Boa sorte! Acho que vais precisar.
- Não subestimes o chefe George! Sou um perito em sopas. – O meu pai estava bastante bem-disposto.
E num passo apressado encostou o portão do quintal e dirigiu-se para a cozinha.
Eu permaneci no Quintal e apanhar aquelas aragens que as copas das árvores soltavam com o soprar do vento.
Ao longe, avistei a Torre principal da Igreja que se erguia no meio dos imensos bosques de Fort Sim… É incrível… onde quer que eu esteja avisto sempre aquela linda Igreja envelhecida pelo tempo. A melodia proveniente dos sinos daquela torre era simplesmente fantástica. Sentei-me no banco de jardim do Quintal e fechei os olhos, mas mais uma vez, ouvi as gargalhadas da criança. Parece que estão por toda a parte, e eu não sei de onde vêm.
Abri os olhos e deparei-me com uma criança à minha frente. Era uma rapariga muito bonita, com uns olhos verdes claros e cabelo negro como o ébano.



- Olá… quem és tu? – Perguntei eu, mas a rapariga não respondia. Apenas se limitava a olhar apaticamente para mim, o que me começava a incomodar. – Os teus pais? O que fazes aqui?





- Estás-me a ouvir? Como te chamas?
Nesse momento o meu pai veio ter comigo com uma cara muito intrigada.
- Melody! Estavas a falar sozinha?
- O quê? Não! Estava aqui uma criança.
- Não está aqui ninguém… só eu e tu!
- Impossível… - Sussurrei.
Já não percebo o que se está a passar comigo. Estou louca.
- Anda para dentro. O jantar está quase pronto.
Pondo o seu braço, carinhosamente, nas minhas costas, levou-me para dentro.
Ao jantar não disse nem uma palavra, sabendo que o meu pai odeia que eu esteja calada, pois ficou mal habituado quando era pequena, que era bastante faladora.
Quando me preparava para ir dormir, o meu pai não hesitou em perguntar:
- O que se passa contigo? Ficaste calada de um momento para o outro!




- Nada… Vou dormir, estou só cansada…

Dei um beijo ao meu pai e subi para o meu quarto.

Passei a noite a pensar naquela criança que apareceu à minha frente no quintal. Desta vez não parecia uma sombra… uma imagem turva que desaparece com o esfregar dos olhos e fosse considerada uma alucinação… não. Era tão real… tão… humana. Estou tão confusa.


Trailer 2



Capítulo 20

Cheguei dez minutos atrasada à primeira aula. Corri até à sala de aula, bati à porta e sentei-me no meu lugar:
- Sabe que horas são, Melody? – Perguntou a minha professora.
- Desculpe o atraso, ‘stora!



Pedi à Cassie os apontamentos que tinha perdido e comecei a escrever.
Mal tocou para o intervalo, o Jake veio ter comigo, com o seu típico sorriso de orelha a orelha dizendo:
- Bom dia, Mel! Olha, hoje a Biblioteca vai estar reservada para a feira do livro! Já não temos onde fazer o trabalho, e já falta muito pouco tempo para a semana acabar!
- Esqueci-me completamente que a Biblioteca ia fechar! Porque não passas em minha casa? Podemos fazer lá o trabalho! – Propus eu, embora não estivesse com vontade nenhuma de fazer o trabalho, sabia que tinha de me esforçar pois estou no ano mais complicado da minha vida.
- Boa ideia! Não incomodo?
- Não! Não te preocupes… pode ser às 16 horas?
- Óptimo… assim que sair dos treinos passo por tua casa. Até logo Mel!
Com isto, correu até ao campo de Futebol do Pátio da Escola com a sua bola da sorte na mão e foi jogar com os seus amigos.
A manhã passou de uma forma bastante calma, tirando o teste surpresa de Matemática que o meu Professor, que não perdoa ninguém e tem um aspecto bastante severo, costuma fazer todas as semanas. Irrita-me aquela sua maneira tão antiquada de pensar. Usa sempre um fato clássico com a sua áspera barba… Anda sempre com a sua mala onde contém os imensos livros de Matemática, e, claro, a sua Bíblia que põe todos os dias sobre a sua mesa, todas as aulas. E claro, aquele aspecto de professor maléfico que assusta qualquer aluno.



Ao fim do dia, fui para casa almoçar e repousar um pouco. Avisei o meu pai que o Jake vinha a casa, e ele reagiu bastante bem. Talvez porque queira que eu me socialize com os meus novos colegas.
Quando ouvi a campainha da porta de casa, dirigi-me até lá e abri a porta.
- Olá! – Cumprimentou o Jake.
- Olá… entra.
O meu pai levantou-se do sofá, e, como eu esperava, tentou socializar-se.
- Ora este rapaz deve ser o teu colega não é?
- Jake, senhor… - Completou o Jake.
- Jake! Muito bem… fiquem à vontade! Qualquer coisa estou no Quintal!
Com isto, num passo acelerado, foi para o Quintal, enquanto eu e o Jake concluíamos o trabalho.
- O teu pai é muito simpático!
- Sim… ele gosta muito de se socializar! Vamos trabalhar?



- Vamos!
Pouco tempo depois de começarmos a trabalhar, alguém bateu à porta.
- Eu vou lá! Deve ser o meu pai…
Mas qual não foi o meu espanto, que mal abri a porta de casa me deparei com uma pessoa que não desejava nada ver. O Ron. Desta vez, sem as suas roupas desportivas nem desleixadas, mas com uma roupa mais casual.
- Ron? Huh… Não estava à espera de te ver aqui.
- Posso entrar?
Fiquei apavorada. Não estava mesmo à espera de ver o Ron naquele momento… aliás, pensei que nunca mais o ia ver.
O Ron entrou, a passo lento, em minha casa. Pisou o Hall e de seguida a sala, onde estava o Jake.
- Huh… Jake, este é o Ron! – Disse eu, um pouco insegura.
- Sim… eu sei quem ele é! Olá.
- Olá, Jake! Meu deus! Tu és o Capitão da Equipa “Os Lamas” não é?
- Sim… Melody, pensei que íamos trabalhar. – Disse o Jake com uma cara trancada.
- Desculpem se vim interromper, mas só precisava de falar com a Melody. Podemos falar?
- Claro, vamos para a cozinha, Ron.
Fomos para a cozinha. Naquele momento não fazia ideia do assunto que o Ron queria falar comigo, só sabia que me estava a por extremamente nervosa.
Encostou-se à bancada do lava-loiça e, com uma voz rouca, disse:
- Eu gosto de ti. Tu sabes disso Melody! E… desde aquele dia na praia que não me sais da cabeça!



- Se não saí, vou ter de sair. Esquece, Ronald! Eu não gosto de ti como namorado! Apenas gosto de ti como um grande amigo e tu vais ter de lidar com isso, quer queiras quer não…
- Eu sei… e não foi por isso que eu vim aqui. Vim aqui para me despedir. Já juntei dinheiro suficiente para os primeiros 3 meses de Faculdade. Parto amanhã de manhã.
- Oh… não sabia, Ron.





- Por isso… adeus Melody! Por mais que o tempo passe, irei sempre pensar em ti! – Disse ele com as lágrimas nos olhos.
- Ron, por favor… Esquece-me. Tu vais encontrar alguém que realmente te mereça! Esquece-me!
- Talvez, mas agora, é de ti que eu gosto. Melody… posso dar-te um último beijo?
- Huh… Ron! Não… a sério. Não tornes as coisas mais difíceis! Tu tens de me esquecer! – Eu já estava alagada em suores frios.
Mas quando dei por mim, já estava nos seus braços, com os meus lábios a tocar nos dele.
Mas nesse momento, o Jake entrou pela cozinha adentro dizendo:
- Melody! Daqui a meia hora tenho de ir para casa. Temos de acabar o trabalho.
- Claro! Vamos… Adeus Ron! – Despedi-me do Ron de uma maneira fria e rude, maneira essa que podia ser evitada se ele não insistisse tanto numa relação amorosa que eu não quero nada ter neste momento.
Agora, ele vai seguir a sua vida… e eu a minha. Ele vai ter de aprender a esquecer o passado, tal como eu fiz.



Capítulo 19

Todos os canais de Televisão diziam o mesmo: Alerta Vermelho. Estava bastante vento e chuva lá fora. Conseguia ouvir o assobiar do vento, o flutuar das copas verdejantes das árvores do quintal.
Ao jantar, o meu pai não parava de me bombardear com perguntas e assuntos de conversa, quando a coisa que eu mais queria era estar em silêncio.



- Como estão a correr as aulas? – Perguntou ele com a boca cheia.
- Bem…
- E o tal trabalho? Aquele teu colega parecia-me bastante simpático.
- Sim… é.
- Que se passa contigo, filha? Estás tão ausente. Estarás doente?
- Não, pai. Não te preocupes. Só ando cansada, mais nada.
Levantei-me… as minhas pernas latejavam. Sentia-me estranhamente ausente, embora não estivesse a pensar em nada. Não me apetecia falar, coisa que o meu pai embirra bastante. Fui para o quarto, sentei-me na cama e tentei ler um livro que tinha requisitado na Biblioteca da escola, mas as letras estavam desfocadas e andavam de um lado para o outro, até a minha vista chorava. Esfreguei os olhos. Ainda tentei ler mais um pouco, mas era escusado, nem uma palavra conseguia ler. Preparei a minha mochila e deitei-me. Nem aqueles Profiteroles que tinha como sobremesa, recheados de Chantilly e cobertos de chocolate quente, me fizeram levantar da cama.
Recolhi-me nos cobertores, desta vez reforçados com mais duas camadas, e fechei os olhos. A única coisa que ouvi quando adormeci, foram aqueles risos… aquelas gargalhadas de criança com o chiar do baloiço. Até que adormeci, e já se pode adivinhar o que sonhei…
Sonhei outra vez com aquela Capela… mas desta vez, senti que era diferente. Apesar de já a ter visto algumas vezes, desta vez a Capela estava muito diferente. Os sinos tocavam, projectando uma melodia muito agradável por toda a cidade.



Ouvia-se de longe. Não me lembro mais nada, se não um som de travagem de um carro, com uma buzinadela a seguir… Foi horrível.
Eu já não estou a entender nada. Estou confusa. Sinto-me sempre ausente e sem vontade de estar com ninguém, tenho estes sonhos, alucinações… Sinto-me completamente atraída por uma Igreja. O que se está a passar comigo?
Levantei-me da cama, vendo os primeiros raios de sol penetrando nas janelas. Fiz os meus cereais, pois, estava faminta… tinha comido mal ao jantar.
Deixei um bilhete no frigorífico para o meu pai ler quando acordasse e fui logo para a Escola. Pelo caminho, ouvi o soar de Sinos. Ecoavam por todas as ruas e bosques daquela zona, chegando-me aos ouvidos. Aquele som tranquilizou-me...
Abrandei o meu passo, cada vez mais, e fiquei a ouvir aquela doce melodia que os Sinos da Igreja proporcionavam. Fechei os olhos, nem o barulho dos carros me incomodava. Pela primeira vez naquele ano, relaxei um pouco.



Consegui ouvir os pequeníssimos sons da Natureza, que nunca ninguém tem tempo nem vontade de ouvir. Eu conseguia reparar que dentro daqueles carros que se movimentavam caoticamente, havia pessoas que não conseguiam ouvir a Natureza. Aliás, todos nós a esquecemos. Ela agora é apenas o chão que nós pisamos, nada mais, mas se pararmos por uns instantes, fecharmos os olhos e ouvirmos um pouco o que a Natureza nos tem para dar, descobrimos sons inacreditáveis que nunca pensámos que existiam. Sons que nos acalmam, que nos fazem esquecer o stress que nos rodeia no nosso dia-a-dia.



Mas aquela minha calma logo se transformou em ansiedade. Por instantes, no meio daqueles maravilhosos sons da Natureza ouvi, outra vez, os risos da criança. No meio daquela rua, repleta de crianças, já nem sabia se era real ou não. Não… não era real. Aqueles risos que me invadiam a cabeça eram muito diferentes dos das outras crianças daquela rua. Um riso, que parecia meio feliz e meio sofredor. Abri os olhos, olhei em redor… do outro lado da estrada, estava a Igreja. Cometi uma loucura. Pus um pé na estrada, não reparando se era na passadeira ou não, depois outro… atravessei a estrada completamente lunática, até que olhei para o lado e um carro vinha na minha direcção a toda a velocidade.





Fez uma travagem repentina, causando um som perturbador com os pneus, e depois, o condutor buzinou, furioso dizendo:
- Oh miúda! Vê para onde andas! Queres morrer, é?
- Desculpe! Peço imensa desculpa! – Lamentei eu, correndo para a calçada.
Apanhei um susto de morte, o meu coração batia a toda a velocidade. Parei um pouco, fiquei a olhar para o carro, que já ia muito à frente virando numa curva acentuada. Recuperei o fôlego e olhei de novo para a Igreja. Caminhei até lá… os Sinos não paravam de tocar. Ainda me pergunto se alguém vem àquele lugar, tirando os padres que provavelmente habitam dentro dela. Mas essas pessoas não sabem o que perdem… eu sempre que vou àquela Igreja a minha alma fica reconfortada e esqueço-me de tudo e todos os problemas que me aguardam na Escola. Mas ainda há algo que me faz ter vontade de ir para a Escola… algo ou alguém. Apesar de não ter vontade, às vezes sinto-me com bastante confiança e vontade de ir para a Escola… O que será?