Capítulo 80



Abri o papel, e um misto de nervosismo e entusiasmo invadiu-me o coração. Era uma sensação inexplicável que se intensificava de uma fora incessável. No papel, estava uma letra um pouco rabiscada, mas que eu conseguia ler perfeitamente. Comecei a ler.

“26 De Dezembro de 1992

Hoje discuti, pela primeira vez, com o Arthur. Nem sei a razão porque fui ter com ele àquele escritório. Estou cansado de discussões e insinuações sobre o facto de eu não querer dizer à minha filha que a Melody morreu. Jamais alguém compreenderá a razão que me levou a fazê-lo… jamais. De todas as dificuldades que já enfrentei, nenhuma foi tão difícil como a que estou a enfrentar agora. A tristeza… o buraco negro que se instalou no meu coração deixa-me sem forças para viver. Prometi a mim mesmo que prosseguia com a minha vida, junto da minha filha, mas essa promessa está prestes a romper-se. Não consigo suportar esta terrível e, quase inaceitável, perda. Toda esta tristeza reflecte-se no que eu faço no meu dia-a-dia. Não faço as minhas coisas com tanta disposição e vontade que fazia anteriormente. Mas o que me deixa ainda mais abalado no meio disto tudo, é o pouco, ou nenhum, apoio que recebi por parte da família da Melody.


A Lydia, a mãe da Melody, olha-me desdenhosamente, e não aprova esta minha decisão, de não contar nada à minha filha. O Arthur, quase que já nem me atrevo a dirigir-lhe a palavra. O seu olhar, não desdenhoso, mas furioso, dá a entender, de forma perfeitamente nítida, que também não aprova a minha decisão. Ninguém aprova, e, confesso, que se eu não soubesse o Porquê desta decisão, que também não aprovava. Mas… apesar de tudo o que me dizem, estou de consciência limpa e leve.
Vou concretizar o desejo da Melody, e dar à nossa filha o que a vida tem de melhor. Vou vê-la crescer, ensiná-la a andar, a falar... Acompanhá-la nos estudos, e vê-la evoluir. Quando digo que não estou preocupado com o futuro, refiro-me ao momento, que eu não duvido que chegue, em que a minha filha descubra que eu lhe menti. Mas não há nada que eu anseie mais, do que vê-la crescer, e esse, é o futuro que eu mais quero.
Os meus amigos, colegas de trabalho, e até a minha família, não aprovam a minha decisão, que, na verdade, nem é bem minha.


Tudo começou na noite de 19 de Outubro, dois meses antes de a minha filha nascer. A Melody começou a sentir-se muito indisposta e tonta. Vomitou a noite inteira, e só se sentia razoavelmente melhor quando se deitava. Comecei a preocupar-me, mas ela dizia-me sempre que era normal da gravidez, e tentava mostrar-me uma cara bem-disposta e despreocupada, mas eu sabia que por dentro, o seu medo era mais intenso do que qualquer coisa. Passaram-se semanas e semanas e a Melody continuava constantemente maldisposta, até que a levei ao médico, que disse que o acidente recentemente acontecido, o atropelamento, tinha deixado marcas negativas na sua gravidez, e que, a partir daquele dia, iria ser considerada uma gravidez de risco. Contudo, a Melody negou por completo, e afirmou que se sentia bem e que aquele atropelamento não passava de uma pequena pancada, que apenas mostrou os seus sintomas de uma forma passageira. Eu e o Arthur estávamos extremamente preocupados, mas a felicidade e ansiedade da Melody, pelo dia do parto estar para breve, deixava-nos mais descansados, e éramos forçados a acreditar que aquilo não passava de um dos complexos sintomas de gravidez. Até que subitamente, a Melody melhorou, o que me deixou muito aliviado.


Passaram-se dias, e nem um sinal de indisposição ou tontura, até que, gradualmente, comecei a esquecer o que tinha acontecido. A sua alegria de viver, dava-me ainda mais vontade de a beijar e abraçar. Iríamos construir uma família nossa, uma família perfeita, feliz e em harmonia. Nada me punha triste ou abalado, naquela fase, apenas conseguia pensar, tal como a Melody, no dia em que a nossa filha ia nascer. Compramos-lhe roupa, mobiliário, brinquedos. Fizemos obras na nossa casa, o que mudou por completo as nossas vidas. Mas um mês depois, a Melody teve uma recaída, que a deixou ainda mais abalada e sem forças. Foi uma recaída ainda mais intensa do que a anterior, e a Melody começou a não poder estar de pé mais do que cinco minutos, as tonturas eram frequentes, e os vómitos também. Não obstante, ela continuava feliz e satisfeita com a vida. Falava com a minha filha constantemente, afirmando que o dia do seu nascimento seria o mais feliz da sua vida, e que estava ansiosa por a ter nos seus braços. Mas ela já sabia… já estava ciente do seu triste destino. Estava ciente que não a poderia ver, não a poderia ter a seus braços, nem sequer ouvir o seu choro.
E foi aí, que, um dia, a minha vida deu uma volta de trezentos e sessenta graus.”

* * *


Não podia acreditar que tinha perdido o papel. Andava com ele no bolso de trás das calças há 18 anos. Tinha-se tornado uma rotina tirar o papel das calças quando estas iam a lavar e pô-lo de manhã no bolso de trás das que ia usar. Nunca o esquecera antes. Saí apressadamente de casa, com medo de ter perdido o papel definitivamente. Sentia-me ansioso. Parecia que tinha milhares de borboletas na barriga, e até respirava com rapidez. Mal entrei no carro, arranquei, ignorando o tiquetaque que o carro fazia quando não punha o cinto. O que eu queria era chegar a casa da avó da Melody rapidamente. Talvez ainda houvesse uma hipótese, por muito remota que fosse, de reaver a pagina do meu diário.


* * *

“A Melody veio ter comigo, com um olhar terno e brilhante, e disse-me, infinitamente, que me amava, e que eu tinha sido a melhor coisa que lhe tinha acontecido na vida. As lágrimas brotavam-lhe dos olhos como se fossem riachos e abraçava-me fortemente.
A Melody já sabia que ia morrer, embora eu o negasse constantemente. Ela enfrentava a morte mais corajosamente do que qualquer outra mulher. E foi por isso, que ela me encarregou desta missão. Eu tenho uma missão! Uma missão que imortalizou o nosso amor… Proteger a minha filha. A última coisa que a minha esposa desejava, era que a sua filha viesse ao mundo para sofrer. Ela recusava-se a crer que a sua filha fosse confrontada com uma verdade tão dolorosa como aquela.
Foi por isso que ela me pediu que eu tomasse conta da minha filha, servisse de um pai e de uma mãe e, acima de tudo, encobrisse a sua morte. Ela insistiu, quase que implorou, embora eu, apesar de recusar a ideia de ela morrer, discordasse totalmente com aquele pedido, o que desencadeou numa discussão sem fim.


Até que, no dia do nascimento da minha filha, tive de encarar aquele pedido da minha amada, como uma missão, que levei avante, e fui contra tudo e todos, sem revelar o porquê da mentira, a pedido da minha mulher. Mantenho este segredo comigo, até onde a vida me levar… “


5 Response to "Capítulo 80"

  • João Says:

    Meu Deus!
    HAAA!
    NAo acredito no que li!
    HAAAAA!
    Agr sim, tou super entusiasmado! Quero mais, please! *-*


  • ¡๓εร Says:

    UAU!!!! OMG!!!

    Pois é.... agora percebo o porquê de ele não ter contado a verdade à Melody!!! *.*
    Coitado...... Mas agora que a Melody sabe já pode perdoar o pai, não?? (lol)

    Está meso LINDO!!! Agora o pai vai a casa da avó e vai ver a melody!!! :D :D

    A sério.. ADOREI!!


  • mmoedinhas Says:

    AHA! Eu sabia!!!!!!!!!!!! Bem me parecia! Só podia! O pai nao podia andar a esconder uma coisa assim como esta!

    A Melody vai finalmente perdoar o pai. yay!
    COncordo com A ines! Agora o pai vai ter com ela!!!!!! *histerica*

    Quero mais senao expludoooooooooo


  • Kátya Says:

    *.*
    ADOREIIII ='D
    quero mais e mais e MUITOO mais *.*


  • Diogo Says:

    Adorei beuda e digo-te quando começei a ler o episdio uma das tuas frases "contou-me" o que se poderia passar e estava certo! ADOREI MESMO! agora compreende-se melhor especialemtne ela! ADOREI E TENS DE CONTINUAR COM O PROXIMO! PLEASEW


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