Capítulo 61

Revoltada com tudo o que acontecera, entrei no quarto e bati com a porta. Deixei-me cair no chão, completamente fora de mim.
Não podia continuar nem mais um segundo em casa. Como iria olhar para o meu pai durante a refeição? Como é que o encararia de manhã? Tinha de fugir… tinha de deixar aquela casa, talvez temporariamente, ou talvez para sempre, que era o mais provável.
Quando a noite cobriu Fort Sim por completo, e o relógio já contava as duas da manhã, tirei ao acaso alguma roupa e guardei-a dentro de uma mala suficientemente grande para albergar o que queria levar. Escrevi um bilhete apressadamente para o meu pai, para que ele soubesse de todas as minhas intenções, embora achasse que ele não merecia que eu lhe escrevesse o que quer que fosse que desse satisfações do que eu ia fazer. Por último, tirei da mesa-de-cabeceira a única coisa que eu não podia evitar levar comigo. A moldura com a foto da minha mãe. Na fotografia, conseguia vislumbrar os seus lindos olhos verdes-água, e o seu sorriso resplandecente que retratava a sua alegria de viver. Acariciei-a e depois coloquei-a cuidadosamente na mala.


Durante alguns segundos, os meus olhos ficaram presos a olhar para o quarto. Talvez nunca mais lá voltasse e aquela fosse a minha última oportunidade de o ver...
Saí do quarto e desci as escadas silenciosamente, ainda a observar com atenção a casa. Tudo aquilo me parecia surreal. Descobrir a realidade da minha vida daquela forma era muito mais do que eu conseguia suportar. E fugir de casa, parecia-me a única solução viável. Olhar em redor, em casa, parecia muito pior do que ver sombras e fantasmas do passado e isso punha-me cada vez mais triste.
O meu pai dormia, estendido no sofá, com a mão pendurada, que segurava um jornal. Não pude evitar a onda de tristeza que me invadiu a alma ao ver o meu pai dormir.


Sabia que fugir de casa era a única coisa que eu me sentia capaz de fazer nesse momento, mas não pude negar que essa solução me afectava, de uma maneira ou de outra. Dirigi-me silenciosamente à mesa de centro e deixei lá o recado que escrevera para o meu pai. Posicionei-o de modo a ser-lhe impossível ignorá-lo. Após resistir com dificuldade ao impulso de aconchegar a manta ao meu pai, uma vez que ele poderia acordar, saí da sala para observar uma última vez a cozinha, onde o meu pai deixava sempre queimar a comida, e às vezes tinha de ser eu a fazê-la. E após tudo isto, saí de casa, com os meus olhos a arderem impiedosamente.
A rua encontrava-se desértica e rigorosamente silenciosa. Com a minha mala às costas, comecei a andar pela calçada da estrada. Estava uma noite distintamente fria, e eu tinha pouco agasalho mas voltar atrás era o que eu menos queria.
Sabia exactamente para onde ir, mas precisava de algum transporte que me levasse a esse lugar…

***


Acordei com o som da televisão que transmitia o Diário da Manhã com as suas típicas notícias catastróficas.


Por momentos, pensei que aquela discussão entre mim e a Melody tinha sido apenas um sonho, mas afinal não. Ela descobriu toda a verdade, embora eu não saiba como, e agora odeia-me. Nem queria acreditar na realidade… a minha única razão de viver… desapareceu. É nesta altura, em que eu penso que devia ter dado ouvidos ao Arthur. Ele bem me avisou, mas agora não há nada a fazer. Fiz com que a minha filha sofresse todos estes anos com a perpétua ausência da mãe, e agora sofre ainda mais.
Levantei-me, com a cabeça a pulsar de dor, e as costas a latejar, como se tivesse levado dez facadas. Admirei-me com o silêncio que reinava em casa, pois a Melody já devia estar acordada.
- Melody? – Chamei.
Mas não respondeu, embora eu não me admirasse nada. Ela de certeza que tinha saído de casa cedo, para não me ter de encarar. Sentia-me, como ela disse, um covarde e um estúpido. Sentia-me inexplicavelmente arrependido por lhe ter batido. Eu nunca… nunca tinha batido na minha filha, mesmo nos momentos em que ela cometia os erros mais graves. Sou um monstro…
Apaguei a televisão, e quando pousei o comando na mesa de centro, reparei num papel meio amachucado, com letras um pouco desengonçadas, dando o aspecto de que foram escritas à pressa, mas mesmo assim consegui distingui-la. Era a letra da minha filha:

“Pai,
Não te quis acordar, pois seria muito mais difícil para mim.
Saí de casa, e não sei quando volto. Tenta compreender-me, não conseguia permanecer em casa nem mais um segundo e ter de te encarar. Não mudo a minha opinião de ontem, que és um covarde e que me devias ter contado que a mãe tinha morrido, mas não quero falar mais sobre o assunto e quero seguir em frente… sozinha. Desculpa se te desiludi, mas agora também não estás em posição de lamentares o meu comportamento, porque tu também me desiludiste… e muito. Partiste-me o coração pai… tu… eu sempre confiei em ti. Mas agora isso não interessa.
Não tentes procurar-me nem telefonar-me, porque, para além de ter o telemóvel desligado, eu vou estar muito bem onde vou, talvez melhor do que aí.
Talvez um dia volte, e talvez ainda te possa perdoar, mas agora não. Agora sou incapaz de te perdoar, e tu tens de perceber isso, quer queiras quer não.
Adeus,
Melody”

Quase que me deixei cair no chão da sala. Naquele momento tinha ficado ainda mais triste e arrependido pelo meu comportamento, e por ter mentido à minha filha. Eu não presto, e vou viver com esse facto o resto da minha vida.


***


- Quanto é?
- Dez Simoleões, por favor.


As minhas poupanças sumiram todas devido ao exagerado preço daquele Táxi, mas por uma boa razão.
Estava diante de uma casa mesmo à beira-mar.


Estava tal e qual como me lembrava. Rústica e com aquele típico aspecto acolhedor e tentador. Podia sentir o agradável e calmante cheiro salgado do mar a inundar-me as narinas. Nada me fazia voltar atrás… era ali onde eu ia ficar, e onde eu me iria sentir bem. Iria estar no local certo, com a pessoa certa…


4 Response to "Capítulo 61"

  • Diogo Says:

    ADOREI! Onde será que ela vai? Só me le,mbro de 2 pessoas! Espero para ver, ADOREI MUITO!!!!


  • João Says:

    OMG OMG!
    Quem será??
    Vou morrer já já!
    Será o Jake?
    Eu cá acho que sim....
    *roi as unhas incansavelmente e olha para o monitor com os olhos muito abertos*
    Quero maaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaais!
    YAY!



  • mmoedinhas Says:

    Eu ja descobri mas nao digo xD
    Só sei que tou ansiosa para saber como a pessoa "que eu sei quem" vai recebe-la...

    ARRRRRG estou tao ansiosa!!!! *coraçao aos pulos*

    E com a saida de casa e tudo descoberto, acho que este capitulo marca uma nova aventura, uma nova "jornada"...

    So sei que se calhar nao volto a ver o dave! :( Vou ter saudades!!!!!!!!


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